No meio de um nevoeiro; é assim que começa esta história. Da noite negra e nebulosa não se avista nem fim nem meio. Terão de ser outros a delineá-la: para isso emprestarei a minha caneta. E a história ganhará uma estrada e passará as fronteiras do imaginável.
O ar húmido e frio ganha terreno na noite antes estrelada. O olhar ainda não alcança nada, no meio da noite asfixiante.
Apenas se vê um caminho sinuoso e pedregoso, mais claro do que o resto. A lua estará algures, a sondar o céu invisível. É noite de lua cheia e nem por isso a noite perde os seus mistérios.
Um vulto, envolto de um negro azulado, aproxima-se. Passo a passo, trilha o caminho que leva a uma qualquer cidadela. “Falta pouco”, pensa o estranho, “Saint Mousnier é daqui a alguns passos, basta seguir o trilho…”
Decidira confiar em conselhos de estranhos que encontrara no caminho. Teve sorte, não eram ladrões mas mercadores, conhecedores dos caminhos, perigosos e escassos, que serpenteavam em direcção às cidades.
Eram cinco irmãos que se tinham dedicado ao comércio das lãs, produzidas no Norte do Reino. O negócio era próspero e o ofício, de família, e o sangue sempre nos transmite algumas coisas úteis.
O estranho e os mercadores seguiram durante sete dias o mesmo caminho; uma viagem por terra é sempre mais segura com companhia. Por fim, a encruzilhada ditara o fim do caminho comum. Depois das despedidas, o mais novo, um jovem na casa dos vinte, estranhando o silêncio constante do desconhecido, perguntara:
- Quem sois afinal?
O desconhecido, com os olhos postos no fim da estrada que iria seguir, virou lentamente a cabeça e olhou atentamente para o jovem mercador:
- Sois mercador, outros são ladrões, outros ainda são lavradores… Quem sou eu? Sou a memória do que fui e a esperança do que serei. – o sorriso abriu-se no rosto numa expressão magoada – Sois jovem, não sabeis que a vida nos reserva mais do que queríamos…
O sorriso morreu, e com ele a sua faceta mais transparente; voltou a ser opaco, um livro fechado. E o jovem, visivelmente pelo brusco fecho de uma tese de vida, despediu-se cordialmente e os cinco fizeram-se ao caminho.
O vulto ficou a olhar para o grupo até ele desaparecer de vista como uma memória a escapar-se da mente. Virou a cabeça e olhou o céu: as nuvens começavam a amontoar-se.
De nuvens a nevoeiro, do dia para a noite…
E vulto continuava a sua viagem pela noite escura e asfixiante…
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Este era para ser o ponto de partida para uma história escrita no colectivo. Mas tal não aconteceu e decidi aqui publicar o único texto de uma aventura curta e mal sucedida. Apenas uma forma de dizer adeus a um projecto que estava sediado num blogue agora eliminado...